Pular para o conteúdo principal

partos.

Não é de hoje que tenho meus encantos por partos, e também nem lembro exatamente quando foi que isso começou. Parir e, consequentemente, tornar-se mãe é, na minha opinião, poder atingir o máximo da feminilidade, e sinto-me orgulhosa por ser mulher e um dia, quem sabe, poder viver esse momento. 

Infelizmente, há muita coisa errada na forma como se tem encarado o parto, seja o vaginal, seja o cesariano. Desde o século passado, uma série de conceitos e valores distorcidos acerca desse assunto foram estraçalhando tudo o que a natureza sabiamente construiu para que mulher e filho tivessem a garantia de um parto seguro. 

A medicina, minha doce medicina, foi a maior culpada por isso. Os médicos têm esse defeito (ou qualidade, dependendo da forma como se vê) de querer garantir que nada saia do controle. E o parto, é bom esclarecer, não pode se encaixar em uma linha que jamais sai do controle. Cada mulher desenha sua linha de parto. Cada mulher tem seu tempo, sua dor, seu jeito de parir. 

Por isso então o parto cesariano se encaixa tão bem no "controle" que a medicina deseja ter sobre as coisas: escolhe-se o dia, a hora, a equipe, põe-se a mulher em decúbito dorsal, faz-se aquela incisão com o bisturi e... veja só! Eis que surge o bebê. Simples, rápido, claro, e precipitado. Cesariana é um procedimento cirúrgico e como tal carrega os riscos de toda cirurgia. É indicada em situações específicas em que há risco materno e/ou fetal, e não ao bel prazer do médico ou da paciente. 

Sim, sou defensora do parto vaginal. Poderia gastar aqui muitos caracteres mostrando vantagens dessa via de parto e muitos outros contra argumentando todas as desvantagens que porventura citassem. Segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), a taxa aceitável de cesarianas deve ficar em torno de 15%, porém atinge proporções ao redor de 80% no sistema de saúde privado brasileiro. No SUS, essa taxa consegue ficar em menos de 50% graças a incentivos financeiros oferecidos pelo governo em favor do parto vaginal, porém a realidade mostra que a maioria dos partos vaginais feitos ficam dentro daqueles padrões animalescos vistos em qualquer maternidade por aí, inclusive na nossa. 

Sendo bem prática, basta eu fazer uma rápida enquete entre minhas colegas de turma para constatar que a maioria prefere submeter-se ao procedimento cirúrgico em detrimento da dor e do possível prolapso ou laceração de períneo que, segundo elas, são consequências inevitáveis do parto vaginal. Mal sabem elas, contudo, que muitos desses "problemas" advêm das iatrogenias que a medicina, tão intervencionista e controladora, insiste em cometer. Das que heroicamente dizem que preferem o parto normal, sinto dizer que, em nossa capital, não há um hospital se quer na rede privada (me corrijam, se eu estiver errada) que tenha estrutura para assistir uma mulher que opte por esse tipo de parto. Então me diga: que opção temos? 

Por isso, informem-se. Há muito a se saber sobre isso. Fico bastante triste por estar em um hospital maternidade-escola de enorme tradição na cidade e referência em atendimento aos casos obstétricos mais complexos e ver que pouco se sabe sobre como conduzir um bom parto vaginal segundo os mais novos preceitos da humanização. Pior, é mais triste ainda saber que às vezes até se sabe, mas que por preconceito, medo, mito ou sei lá o que, não se faz aquilo que tem sido preconizado pelo ministério da saúde há anos. 

Por fim, muitos me disseram que a MEAC me faria mudar de ideia quanto ao parto vaginal, mas digo com veemência que nada, nada mesmo, mudou. Ao invés disso, sinto ainda mais forte a vontade de defender esse momento que, como eu disse no início, é o símbolo maior da nossa feminilidade.

Comentários

B.R. Rosado disse…
Parabéns pelo texto! Por que é tão difícil se fazer perceber as vantagens do parto vaginal neste país? Penso que, numa sociedade que aprendeu as vantagens do dorflex, sentir dor é uma corrupção nefasta de nossa natureza!
No mais, adoro esta linha de textos que você publica, contando as maravilhas (e outras nem tanto) que se apresentam na fantástica arte de ser médico! Leio e saboreio sua doce voz em cada linha! Aguardo por mais!

Postagens mais visitadas deste blog

postagem breve 2.

Você já reparou na beleza do seu cotidiano? Aquela beleza que fica nas entrelinhas, omitida pelas tarefas enfadonhas, repetitivas e pouco prazerosas? Percebo que dia após dias minha vida está sendo consumida por cotidiano... Se eu não tirar dele a beleza das entrelinhas, certamente serei infeliz.

reclamando da vida?

Dias atrás, estava eu checando o e-mail da minha turma quando vi uma mensagem deixada por um colega. Nela havia o link de um vídeo do youtube, junto de uma breve recomendação de que todos deveríamos ver esse vídeo ao menos uma vez na vida. Curiosa como sou, cliquei e me maravilhei com o que vi. O vídeo era sobre a história de um homem que nasceu sem braços e sem pernas. Mostrava a trajetória dele e como ele fez para superar as adversidades - que certamente não foram poucas - e se tornar uma pessoa feliz. No vídeo, há trechos de uma palestra que ele dá a jovens em escolas, mostrando que não vale a pena você reclamar dos seus obstáculos, quando você tem infinitas possibilidades de ultrapassá-los, basta ser criativo. Pois bem. Precisei lembrar desse vídeo nessa noite. Reclamamos demais das coisas. Muitas vezes, nossa obsessão por observar em quais pontos aquilo pode dar errado nos impossibilita de curtir a maravilha que é quando dá certo. E temos medo de tentar, pois não queremos errar nu...

Fim de mais um semestre...

Semestre acabando e mais uma vez vem a sensação de tarefa cumprida... ou não? hehehe É um dilema, sabe? Pois por mais que estudemos, assistamos aulas e mais aulas e arranquemos nossos preciosos fios de cabelos (no meu caso, semi-loiros)em véspera de provas, sempre fica aquela impressão de que poderia ter sido melhor e de que poderíamos ter estudado mais, ou aproveitado tudo aquilo de outra forma. Fica também outra sensação muito interessante: a de que fizemos tempestade em copo d´água. Nos preocupamos demais com coisas que, no fim, dão certo, mesmo que algumas vezes não entendamos como...xD Infecto, por exemplo, nem foi tão ruim assim... Que é puxado pra caramba, disso ninguém duvida! E que prova é f... (piiiii), isso também é um fato! Mas dá certo, sabe? Tudo dá certo no fim, principalmente se você fica com um professor muito limpeza na prova prática (thanks, God! \o/). Geriatria... Bem, geriatria é o tipo de módulo no qual você pensa: "tenho a sensação de que eu já sabia disso.....