Acho que nunca coloquei aqui meu ponto de vista a cerca da violência obstétrica. Segundo a OMS, o termo refere-se à “apropriação do corpo da mulher e dos processos reprodutivos por profissionais de saúde, na forma de um tratamento desumanizado, medicação abusiva ou patologização dos processos naturais, reduzindo a autonomia da paciente e a capacidade de tomar suas próprias decisões livremente sobre seu corpo e sua sexualidade, o que tem consequências negativas em sua qualidade de vida".
A violência obstétrica pode acontecer desde a porta do hospital, quando não é garantido vaga para internação hospitalar ou quando são proferidas grosserias na recepção, mas também em detalhes, como na falta de privacidade nas salas de parto ou barulho em excesso. Muitos acham que a violência obstétrica não se resume a realização de episiotomia ou Kristeller, mas não. Podemos ser violentos nas palavras e nas ações, e isso é muito sutil. O papel de proteger a mulher de violência obstétrica cabe a toda a equipe que faz assistência ao parto. O médico, que muitas vezes assume um papel de liderança no modelo hospitalar mais tradicional, tem função fundamental em proteger a mulher desse sistema tão cruel. Contudo, será que somos preparados para isso na nossa formação?
Todos nós sabemos que não é fácil parir no Brasil, infelizmente. Por um lado, a mulher tem que correr atrás da informação que conseguir para se proteger de pessoas que queiram impedi-la de parir (vejam só que absurdo!). Do outro lado, quem trabalha com obstetrícia de verdade precisa estar o tempo todo em alerta, buscando as melhores evidências para embasar suas escolhas na assistência ao parto com menos intervenções e mais segurança. Por sinal, acho que o mais difícil para nós, médicos, é ter parcimônia nas intervenções, pois nossa formação é toda baseada nisso: intervir!
No modelo de educação médica que temos hoje, não aprendemos humanização na faculdade ou na residência da forma como tem que ser. Até temos disciplinas sobre isso ao longo do processo, mas são desinteressantes ou mal ministradas, infelizmente. Aprendemos com a vida, com nosso esforço de todo dia nos reconstruirmos e de levarmos o melhor de nós pras mulheres que nos procuram.
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